Assessoria Empresarial – Acordo de Acionistas / Quotistas

ASSESSORIA EMPRESARIAL – Acordo de Acionistas / Quotistas

Dentro de um mercado cada vez mais competitivo e em constante evolução, as sociedades por ações têm se mostrado extremamente úteis para atrair investimentos para o setor produtivo.

Com sua sistemática que viabiliza a captação de recursos, as sociedades por ações vêm se difundido no mercado brasileiro.

Dentre as espécies de sociedades por ações, a sociedade anônima apresenta vários atrativos aos investidores. Trata-se de um modelo que priorizar o capital em detrimento das pessoas e limita a responsabilidade dos sócios ao preço das ações subscritas ou adquiridas.

A liquidez dos ativos, a maior publicidade dos atos da administração e a gestão muitas vezes profissionalizada das sociedades anônimas são características que agradam os investidores.

Como a sociedade anônima é controlada pelo acionista que possui o maior número de ações com direito a voto, uma simples negociação de ações pode gerar a mudança de comando. Essa particularidade costuma preocupar os investidores.

Por esse motivo, para uma maior segurança dos investidores e maior conformidade na administração das companhias, é imprescindível a existência de um instrumento capaz de harmonizar a vontade dos acionistas, no que diz respeito aos seus direitos e obrigações junto à empresa.

O Acordo de Acionista, contrato no qual os acionistas estabelecem como seus direitos serão exercidos frente à companhia, cumpre esse papel.

Por intermédio do acordo de acionista, os investidores minoritários podem, por exemplo, através da formação de um bloco, obter o número de ações suficientes para conseguir o controle da companhia, sem a necessidade de aportar novos recursos financeiros.

O acordo de acionistas também permite que os acionistas minoritários congreguem forças para defender seus interesses frente à companhia e frente aos demais acionistas.

Trata-se, portanto, de um instrumento extremamente importante para o direito societário brasileiro.

Assim, justifica-se se o desenvolvimento do presente trabalho, através do qual se examinará a figura do acordo de acionistas dentro do direito societário brasileiro, especialmente sua aplicação dentro das sociedades anônimas.

Através do método bibliográfico de pesquisa, que se utiliza da análise de Fontes de Direito mediatas e imediatas, ou seja, da legislação pátria, doutrina e jurisprudência, fazer-se-á uma análise superficial do direito societário brasileiro, bem como das sociedades por ações.

Em seguida, fazer-se-á a análise específica do acordo de acionista, discorrendo sobre sua natureza jurídica e demais aspectos importantes.

Fazer-se-á também uma análise com objetivo de identificar as matérias que podem ser tratadas no acordo de acionistas, bem como para identificar as matérias que não podem ser tratadas.

Por fim, serão analisados alguns julgados, tanto do colendo Superior Tribunal de Justiça, como dos tribunais de justiça do Estado de São Paulo e do Estado do Rio Grande dos Sul, para ilustrar o entendimento desses tribunais com relação ao acordo de acionistas.

Toda essa análise será feita com intuito de obter embasamento suficiente para responder as seguintes perguntas:

·O acordo de acionista é via adequada para regulamentar a vontade dos acionistas quanto ao exercício de seus direitos frente à sociedade?

· Quais as matérias que podem e as que não podem ser reguladas pelo acordo de acionistas?

O presente estudo tem o escopo de fornecer à comunidade jurídica uma análise do acordo de acionistas, definindo o instituto e identificando os limites que devem ser seguidos na regulamentação dos interesses dos acionistas.
 
I – O DIREITO SOCIETÁRIO BRASILEIRO
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O Direito Societário é o ramo do Direito que estuda as sociedades e todos seus atos.

Ricardo Negão[i] ensina que:

    “Sociedade é o contrato celebrado entre pessoas físicas e/ou jurídicas, ou somente entre pessoas físicas (art. 1.039), por meio do qual estas se obrigam reciprocamente a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilhar, entre si, os resultados.”

Portanto, a sociedade é um contrato através do qual as pessoas envolvidas se comprometem a desenvolver, com esforço comum, uma determinada atividade.

O Direito Societário brasileiro é fruto das constantes evoluções que o comércio e sua regulamentação vêm sofrendo ao longo dos anos, em todas as partes do mundo.

Essas mudanças, segundo José Edwaldo Taveres Borba[ii], tiveram maior importância a partir da Idade Média, quando a nação da separação entre o patrimônio da sociedade e dos sócios passou a se definir.

Segundo ensina Fábio Ulhoa Coelho, as primeiras normas do Direito Societário brasileiro tiveram influência do direito francês, razão pela qual, em princípio, as sociedades foram divididas em civis e mercantis.

Ensina o ilustre professor[iii]:

    “Quando o ordenamento jurídico brasileiro era filiado ao sistema francês de disciplina privada da economia, fundado na teoria dos atos de comércio (Cap. 1), adotava o conceito de sociedade comercial para a identificação da pessoa jurídica exercente das mais importantes atividades econômicas. Distinguia-a, então, da sociedade civil pela natureza de seu objeto. Sendo este a exploração de negócio definido como ato de comércio, submetia-se a sociedade regime próprio do direito comercial (isto é, estava sujeita a falência, podia pleitear concordata, tinha obrigações específicas de escrituração de livros, etc.) Se o objeto social, no entanto, não fosse ato de comércio, era civil a sociedade.”

Portanto, as consideradas sociedades civis eram aquelas que tinham como objeto atividades de cunho intelectual, como advocacia, engenharia e contabilidade.

Já as sociedades comerciais, como o próprio nome diz, eram consideradas aquelas que se dedicavam exclusivamente ao comercio.

Em decorrência dessa diferenciação, as sociedades comerciais eram reguladas pelo Código Comercial Brasileiro, instituído pela Lei n.° 556 de 25 de junho de 1950. Já as sociedades civis eram reguladas pelo Código Civil.

Acompanhando as evoluções internacionais, o Código Civil promulgado no ano de 2002, adotou a teoria da empresa, acabando com a distinção existente entre as sociedades civis e sociedades comerciais.

Como Código Civil de 2002 passou a regular todas as sociedades, houve a revogação da parte do Código Comercial que tratava das sociedades mercantis.

Em decorrência dessas mudanças, as sociedades passaram a ser divididas em simples e empresárias.

Segundo José Edwaldo Taveres Borba[iv]:

    “As sociedades simples são aquelas que não dispõem de uma estrutura organizacional e as que, mesmo dispondo, dedicam-se a atividades intelectuais, a atividades rurais (agricultura e pecuária) e a negócios de pequeno porte (pequena empresa), cabendo registrá-las no Registro Civil das Pessoas Jurídicas”.

As sociedades empresárias são todas as demais (art. 982), inclusive a sociedade dedicada a atividade rural, contanto que se inscreva no Registro Público das Empresas das Pessoa Jurídicas”.

No Direito Brasileiro, o contrato de sociedade pode ensejar o nascimento de um novo sujeito de direito, conhecido como pessoa jurídica.

Fábio Ulhoa Coelho[v] define pessoa jurídica com sendo:

    “(…) cabe conceituar pessoa jurídica como sendo um sujeito de direito inanimado personalizado”.

Existem, todavia, alguns tipos societários que não dão origem a uma pessoa jurídica. Esses tipos societários são conhecidos como sociedades não personificadas. As sociedades não personificadas se dividem em dois tipos: a) Sociedades em Comuns, reguladas pelos arts. 986 e seguintes, do Código Civil e; b) Sociedade em Conta de Participação, reguladas 991 e seguintes, também do Código Civil.

Assim, temos uma segunda classificação das sociedades: sociedades personificadas e não personificadas.

As sociedades personificadas são divididas em: a) Sociedade Simples; b) Sociedade em Nome Coletivo; c) Sociedade em Comandita Simples; d) Sociedade Limitada; e) Sociedade Anônima; f) Sociedade em Comandita por Ações e; g) Sociedades Cooperativas.

Nossa legislação também prevê as chamadas Sociedades por Ações, reguladas pela Lei n.° 6.404/76.
II – DAS SOCIEDADES POR AÇÕES

As Sociedades por Ações são tipos sociais que têm como principal característica a divisão do seu capital social em pequenas partes denominadas ações. Assim, os sócios desse modelo de sociedade são titulares de ações e não quotas sociais, por isso são chamados de acionistas.

Nas sociedades por ações, diferente do que ocorre em outros tipos sociais, são regidas por Estatutos, que diferem dos contratos sociais principalmente porque não incidam o nome e qualificação dos sócios.

Essa diferenciação se dá porque, nas sociedades por ações, o bem maior é o capital social e não a pessoa dos sócios.

Devido a essa característica de valorização do capital, o acionista não precisa consultar os demais sócios para alienar as ações. Salvo a existência de alguma restrição no estatuto ou em acordo de acionistas, a alienação das ações é livre.

É o que ensina Ricardo Negrão[vi]:

    “Desde seu nascedouro, distingue-se a sociedade por ações das demais porque seus títulos são negociáveis sem necessidade de anuência dos demais sócios, facultando-se o livre ingresso na sociedade.”

Na sociedade por ações, a responsabilidade dos acionistas será limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas.

Portanto, o acionista só responde pelo valor que é representado pelas ações, não tendo qualquer outra responsabilidade, salvo se administrador e agir de forma contrária à Lei ou aos interesses da sociedade.

Por ser um tipo social que não permite que todos os sócios participem da administração direita, as sociedades por ações têm uma maior obrigação de publicidade de seus atos. Essa maior publicidade permite, aos acionistas que não acompanham o dia a dia, acesso às informações mais relevantes da companhia.

Na sociedade por ações, o acionista tem basicamente a obrigação de integralizar o valor das ações subscritas.

Já os direitos dos acionistas, segundo Ricardo Negão[vii], são os seguintes: participação nos lucros sociais, participação no acervo da companhia em caso de liquidação; fiscalização da gestão do negócio; preferência na subscrição de ações, partes beneficiárias conversíveis em ações, debêntures conversíveis em ações e bônus de subscrição; direito de retirada, nas hipóteses previstas em lei.

Para captar de recursos, a sociedade anônima pode emitir os seguintes títulos: ações, partes beneficiárias, debêntures, bônus de subscrição.

As ações decorrem para própria criação da sociedade e de aumento de capital. Os tipos de ações serão tratados em subtítulo próprio.

Já as partes beneficiárias são títulos que só podem ser emitidos por sociedades fechadas e que dão, ao possuidor, o direito de receber lucros da sociedade, durante tempo determinado. Alfredo de Assis Gonçalves Neto ensina que:

    “As partes beneficiárias são títulos negociáveis, temporários, sem valor nominal e estanhos ao capital social, que asseguram aos seus titulares o direito de participação em parcela dos lucros anuais da companhia fechada”.

As debêntures, segundo Gladston Mamede[viii], são instrumentos que conferem aos titulares um direito de crédito contra a companhia e são utilizados pelas companhias para obtenção de mútuo.

Segundo o Autor, a grande vantagem que a debênture confere ao emitente é permitir o fracionamento do mútuo, permitindo a participação de vários interessados, através de investimentos menores.

O bônus de subscrição é um título que outorga o proprietário o direito de adquirir, durante determinado tempo, as ações da companhia por preço pré-definido.

Alguns doutrinadores, como José Edwaldo Tavares Borba[ix], classificam a opção de compra com um título de pode ser emitido pela companhia. Esse título, todavia, não pode ser vendido e não serve para captação direta de recursos.

Diferente dos demais tipos sociais, a lei estabelece para as sociedades por ações uma estrutura administrativa mínima.

Essa estrutura é formada pela Assembleia Geral, Diretoria e Conselho Fiscal.

Ensina Alfredo de Assis Gonçalves Neto, ao tratar da sociedade anônima, que segue regras estabelecidas para todas às sociedades por ações[x]:

    “(…) na sociedade anônima algumas regras especiais, de caráter cogente, no tocante à sua administração. A lei impõe um modelo tripartite de poderes, no qual há (i)uma Assembléia Geral, que é o órgão de manifestação de vontade social, cuja finalidade e deliberar sobre assuntos sociais e definir e as políticas a serem adotadas pela companhia; segue-lhe a (ii) Diretoria, que é o órgão executor dessa vontade, cuja atuação é analisada pelo (iii) órgão de controle, denominado Conselho Fiscal.”

A Assembleia Geral é o órgão máximo da sociedade por ações e tem a competência de decidir sobre os principais assuntos relacionados ao desenvolvimento das atividades da companhia, bem como para decidir sobre assuntos relacionados aos acionistas.

Ela é composta por todos os acionistas da companhia. Todavia, apenas os acionistas com direito a voto participam diretamente das decisões. Os acionistas sem direito a voto têm apenas o direito a voz nas discussões que antecedem a votação.

Ensina Fábio Ulhoa Coelho[xi]:

    “Todos os acionistas, independentemente da espécie ou classe de ações que possuem, têm o direito de participar da assembleia geral, manifestando-se na primeira fase de cada ponto, por meio de pedidos de esclarecimentos, argumentos ou outras falas. Já na fase de votação, manifestam-se apenas os titulares do direito de participar das deliberações sociais. Pode-se, assim, conceituar o voto como a manifestação do acionista, em assembleia geral, acerca de assunto de interesse social, externada nas tomadas de decisões.”

Dentre as principais competências da Assembleia Geral encontram-se a competência para reformar o estatuto social, eleger ou destituir os administradores e fiscais da companhia, suspender o exercício dos direitos do acionista, deliberar sobre transformação, fusão, incorporação e cisão da companhia, sua dissolução e liquidação, eleger e destituir liquidantes e julgar-lhes as contas e autorizar os administradores a confessar falência e pedir concordata.

A Diretoria é o órgão social, composto por no mínimo dois membros, que cuida da execução das deliberações da companhia, sendo, em verdade, o órgão que administra a companhia no seu dia a dia.

As companhias, com objetivo de obter uma administração mais sólida, podem criar um órgão social denominado Conselho da Administração, composta por no mínimo três membros, que terá a função de comandar as atividades da companhia, no lugar da Diretoria.

Dentre as competências da diretoria, pode-se destacar a competência de: fixar a orientação geral dos negócios da companhia, eleger e destituir os diretores da companhia e fixar-lhes as atribuições, observado o que a respeito dispuser o estatuto, convocar a assembleia geral quando julgar conveniente, autorizar, se o estatuto não dispuser em contrário, e alienação de bens do ativo permanente, a constituição de ônus reais e a prestação de garantias a obrigações de terceiros.

Como anteriormente visto, os membros da diretoria e do conselho da administração são eleitos pela Assembleia Geral.

O Conselho Fiscal é o órgão que fiscaliza os atos dos administradores. É composto de no mínimo três e no máximo cinco membros, nomeados pela Assembleia Geral.

Dentre as competências do Conselho Fiscal, estão: fiscalizar os atos dos administradores e verificar o cumprimento dos seus deveres legais e estatutários; opinar sobre as propostas dos órgãos da administração, a serem submetidas à assembleia geral, relativas a modificação do capital social, emissão de debêntures ou bônus de subscrição, planos de investimento ou orçamentos de capital, distribuição de dividendos, transformação, incorporação, fusão ou cisão; denunciar aos órgãos de administração, e se estes não tomarem as providências necessárias para a proteção dos interesses da companhia, à assembleia geral, os erros, fraudes ou crimes que descobrirem, e sugerir providências úteis a companhia; convocar a assembleia geral ordinária, se os órgãos da administração retardarem por mais de 1 (um) mês essa convocação, e a extraordinária, sempre que ocorrerem motivos graves ou urgentes, incluindo na agenda das assembleias as matérias que considerarem necessárias; e examinar as demonstrações financeiras do exercício social e sobre elas opinar.

As sociedades por ações são divididas em dois tipos: sociedades comandita por ações e sociedades anônimas.
2.1 – DA SOCIEDADE EM COMANDITA POR AÇÕES

As sociedades em comandita estão previstas nos arts. 1.090 a 1.092 do Código Civil, e nos art. 280 a 284 da Lei 6.404/76.

Por serem muito semelhantes, a legislação diz que as sociedades em comandita por ações serão regidas pelas regras estabelecidas às sociedades anônimas, com exceção das regras relacionadas ao conselho de administração, autorização estatutária de aumento de capital e emissão de bônus de subscrição.

As sociedades em comandita por ações possuem dois tipos de acionistas: os acionistas de responsabilidade limitada e os de responsabilidade ilimitada.

Ensina José Edwaldo Tavares Borba[xii]:

    “No geral, rege-se a comandita por ações pelas mesmas normas aplicáveis às sociedades anônimas. Trata-se, no entanto, de sociedade de responsabilidade mista, uma vez que, além dos sócios de responsabilidade limitada, dispõe de sócios de responsabilidade ilimitada, que são os diretores ou administradores.”

Nesse tipo social, devido à responsabilidade híbrida, apenas o acionista pode ser administrador da sociedade.

O art. 283, da Lei 6.404/76, diz que a assembleia geral não pode, sem o consentimento dos diretores ou gerentes, mudar o objeto social, prorrogar-lhe o prazo de duração, aumentar ou diminuir o capital social, criar obrigações ao portador ou partes beneficiárias nem aprovar a participação em grupo de sociedade.

As sociedades em comandita por ações, segundo Ricardo Negrão[xiii], não são muito adotadas no mercado brasileiro. Confira-se o que diz o ilustre professor:

    “Entretanto, apesar de tradicionalmente previstas há mais de cento e vinte anos na legislação, não granjearam a estima do mundo empresarial, sobretudo em razão de imporem aos sócios administradores a responsabilidade solidária e ilimitada pelas obrigações sociais.”

2.2 – DA SOCIEDADE ANÔNIMA

Em sua obra, Alfredo de Assis Gonçalves Neto traz a seguinte definição de sociedade anônima:[xiv]:

    “(…) uma sociedade comercial ou empresária cujo capital divide-se em frações iguais, chamadas ações, sendo limitada a responsabilidade de seus acionistas ao preço de emissão das ações por eles subscritas ou adquiridas”.

A sociedade anônima é a mais comum das sociedades por ações e foi criada para facilitar o financiamento das empresas. Através da venda das ações, a sociedade anônima consegue obter recursos para o desenvolvimento de seu objeto social, sem ter que recorrer às instituições financeiras.

A principal característica da sociedade anônima é a responsabilidade limitada dos seus sócios, que só respondem no limite do valor da subscrição ou aquisição das ações.

Quanto ao nome empresarial, a sociedade anônima deve adotar a denominação social, conforme ensina André Luiz Santa Cruz Ramos[xv]:

    “Em resumo, resta claro, portanto, que a S/A jamais poderá adotar firma social como espécie do seu nome empresarial, sendo obrigatório o uso da denominação social. Nem poderia ser diferente, uma vez que, conforme o próprio nome já diz. Trata-se de uma sociedade anônima, não tendo sentido o uso de firma social por parte dela, já que firma é aquela espécie de nome empresarial que identifica os sócios da sociedade, cujos nomes civis constituem o seu núcleo.”

As sociedades anônimas podem ser sociedades abertas ou fechadas. Consideram-se abertas as sociedades que tem seus valores mobiliários (ações, debêntures, etc.) estejam habilitados para serem negociados no mercado de valores mobiliários. Fechadas são as sociedades que não têm ações negociadas nesse mercado.
2.3 – DAS AÇÕES

Alfredo de Assis Gonçalves Neto[xvi] assim definiu “ação”:

    “Ação é a contrapartida da contribuição conferida pelo acionista para a formação do capital social. É um bem que o acionista recebe em substituição àquele (dinheiro ou outras espécies de bens) que entregou à sociedade para formar seu capital e, com isso, torna-se sócio nas condições definidas pelo estatuto social. É, mais precisamente, um bem imaterial, que representa a unidade em que se subdivide o capital social de uma companhia e que confere à pessoa por ele legitimada a qualidade de acionista, com os direitos e as obrigações determinadas pela lei e pelo estatuto social”.

Ação é, portanto, o título que representa o capital social e que confere ao proprietário a qualidade de sócio e o direito de usufruir os benefícios de sua participação na sociedade.

Existem, todavia várias espécies de ações que podem ser emitidas pela companhia, sendo que cada espécie outorga certos direitos ao seu proprietário.

São estes os tipos de ações que a companhia pode emitir: ordinárias, preferenciais e de fruição.

Alfredo de Assis Gonçalves Neto[xvii] diz que as ações ordinárias são aquelas que asseguram aos respectivos titulares os direitos comuns de sócios, como direito de participar de deliberações sociais, de votar e ser votado, de receber dividendos, de fiscalizar a gestão dos administradores, de preferência na subscrição de novas ações, etc.

Segundo o Autor, nas companhias fechadas, todavia, as ações ordinárias podem ser divididas em classes, de forma a limitar os direitos por elas conferidos. Essa divisão é proibida no caso de companhia de capital aberto.

As ações preferenciais conferem ao proprietário o direito de preferência em algumas vantagens definidas no estatuto.

Segundo Gladston Mamede[xviii], normalmente as companhias se utilizam da dicotomia entre ações ordinárias e preferenciais para opor a participação ordinária nas deliberações sociais, por um lado, à participação preferencial nos resultados sociais, por outro.

O art. 17, da Lei n° 6.404/76, diz que as ações preferenciais podem conferir os seguintes direitos aos proprietários: I – prioridade na distribuição de dividendo, fixo ou mínimo; II – prioridade no reembolso do capital, com prêmio ou sem ele; III – na acumulação das preferências e vantagens de que tratam os incisos I e II.

Alguns Autores colocam a ação de fruição como outro tipo ação que pode ser livremente emitido pela companhia. Esse tipo de ação, todavia, é resultado da amortização das ações ordinárias e preferências anteriormente existentes, ou seja, a empresa retira uma ação ordinária ou preferencial do mercado e coloca uma ação de fruição em seu lugar.

Assim, as ações de fruição são emitidas, com as restrições previstas nos estatutos, em substituição às ações amortizadas.

A lei ainda permite que as ações possam mudar de classe. Para ocorrer essa mudança, o estatuto deve prever essa possibilidade e a Assembleia Geral deve deliberar nesse sentido.
2.4 – DO CONTROLE DAS SOCIEDADES POR AÇÕES

Como visto anteriormente, a administração das sociedades por ações é feito através de três órgãos sociais básicos: Assembleia Geral, Diretoria e Conselho Fiscal.

Como na assembleia geral as decisões são tomadas por maioria de votos, o acionista, ou grupo de acionistas, controlador da maioria das ações com direito a voto automaticamente passa a ter o poder de controle da companhia, pois terá condição de indicar os membros da diretoria, ou do conselho da administração, e os membros do conselho fiscal.

Confira-se o que diz a Lei das Sociedades por Ações (6.404/76), em seu art. 116:

    “Art. 116. Entende-se por acionista controlador a pessoa, natural ou jurídica, ou o grupo de pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que:

    a) é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, a maioria dos votos nas deliberações da assembléia-geral e o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia; e

    b) usa efetivamente seu poder para dirigir as atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia.

    Parágrafo único. O acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender.”

Portanto, nas sociedades por ações, o acionista ou grupo que controlar a maioria das ações com direito a voto passa automaticamente a ser considerado o “controlador”.

Segundo Fábio Ulhoa Coelho[xix], o acionista controlador possui uma posição privilegiada perante os demais acionistas. Confira os ensinamentos do ilustre professor, ao tratar da sociedade anônima:

    “O acionista que controla a sociedade anônima usufrui de uma condição privilegiada relativamente aos demais. Como titular da maioria dos votos manifestados em assembleia geral, ele escolhe os administradores, fixa a remuneração destes, altera o estatuto em muita parte, aprova operações de capitalização e securitização e outras, delibera a destinação livre do resultado.”

De acordo com o texto do art. 116, da Lei n° 6.404/76, o acionista controlador tem o dever de agir de forma a não causar prejuízos aos acionistas e à comunidade.

Já o art. 117, da mesma Lei, diz que o acionista controlador responde pelos danos decorrentes de atos praticados com abuso de poder, indicando, inclusive, que as seguintes situações serão consideradas abuso de poder:

a) orientar a companhia para fim estranho ao objeto social ou lesivo ao interesse nacional, ou levá-la a favorecer outra sociedade, em prejuízo da participação dos acionistas minoritários nos lucros ou no acervo da companhia, ou da economia nacional;

b) promover a liquidação de companhia próspera, ou a transformação, incorporação, fusão ou cisão da companhia, com o fim de obter, para si ou para outrem, vantagem indevida, em prejuízo dos demais acionistas, dos que trabalham na empresa ou dos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia;

c) promover alteração estatutária, emissão de valores mobiliários ou adoção de políticas ou decisões que não tenham por fim o interesse da companhia e visem a causar prejuízo a acionistas minoritários, aos que trabalham na empresa ou aos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia;

d) eleger administrador ou fiscal que sabe inapto, moral ou tecnicamente;

e) induzir, ou tentar induzir, administrador ou fiscal a praticar ato ilegal, ou, descumprindo seus deveres definidos nesta Lei e no estatuto, promover, contra o interesse da companhia, sua ratificação pela assembleia geral;

f) contratar com a companhia, diretamente ou através de outrem, ou de sociedade na qual tenha interesse, em condições de favorecimento ou não equitativas;

g) aprovar ou fazer aprovar contas irregulares de administradores, por favorecimento pessoal, ou deixar de apurar denúncia que saiba ou devesse saber procedente, ou que justifique fundada suspeita de irregularidade.

Portanto, o acionista controlador deve respeitar as diretrizes estabelecidas no ao art. 117, da Lei 6.404/76, sob pena de responsabilidade pessoal.
III – O ACORDO DE ACIONISTAS

Como visto no título anterior, o art. 116, da Lei das Sociedades por Ações (6.404/76), diz que o acionista controlador é a pessoa, natural ou jurídica, ou o grupo de pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que tiver controle sobre a maioria das ações com direito de voto.

Assim, a lei claramente autoriza a realização de um acordo que permita a determinado grupo o controle da companhia.

Esse acordo é conhecido como “acordo de acionistas”, para alguns autores “pacto parassocial”, e é regulado pelo art. 118, da Leo n° 6.404/76. Confira-se o texto:

    “Art. 118. Os acordos de acionistas, sobre a compra e venda de suas ações, preferência para adquiri-las, ou exercício do direito de voto, deverão ser observados pela companhia quando arquivados na sua sede.

    § 1º As obrigações ou ônus decorrentes desses acordos somente serão oponíveis a terceiros, depois de averbados nos livros de registro e nos certificados das ações, se emitidos.

    § 2° Esses acordos não poderão ser invocados para eximir o acionista de responsabilidade no exercício do direito de voto (artigo 115) ou do poder de controle (artigos 116 e 117).

    § 3º Nas condições previstas no acordo, os acionistas podem promover a execução específica das obrigações assumidas.

    § 4º As ações averbadas nos termos deste artigo não poderão ser negociadas em bolsa ou no mercado de balcão.

    § 5º No relatório anual, os órgãos da administração da companhia aberta informarão à assembléia-geral as disposições sobre política de reinvestimento de lucros e distribuição de dividendos, constantes de acordos de acionistas arquivados na companhia

Ricardo Negrão[xx] assim define o acordo de acionista:

    “Acordo de acionista é o contrato pelo qual os sócios das sociedades por ações estipulam sobre (1) a compra e venda de suas ações, (2) a preferência para adquiri-las, (3) o exercício do direito de voto ou (4) do poder de controle. As cláusulas são oponíveis a terceiros, desde que o contrato esteja averbado nos livros de registro e nos certificados de ações, retirando-lhes o direito de negociação na bolsa ou no mercado de balcão.”

Luiz Rodolfo Cruz[xxi], que trata o acordo de acionistas como pacto parassocial, traz a seguinte definição em sua obra:

    “O pacto parassocial é um documento firmado por dois ou mais sócios de determinada sociedade, visando fixar regras e obrigações externas ao contrato de sociedade. Assim, possui autonomia forma em relação aos atos constitutivos ou regramento societários impostos pelo ordenamento jurídico, tais como estatutos ou contratos sociais e suas respectivas alterações.”

O acordo de acionista, portanto, é o contrato através do qual os acionistas regulamentam a forma em que os seus direitos serão exercidos frente à companhia. É o contrato que regulamenta como cada parte deve exercer determinados direitos sociais.

Através do acordo de acionistas, pode-se, por exemplo, firmar um compromisso para que um grupo de acionistas minoritários obtenha o controle da companhia. Esse controle , logicamente, só é possível se o grupo de minoritários juntos possuir o número de ações que possibilite o controle da companhia.

O acordo de acionista tem como função vincular a vontade e obrigar as partes envolvidas no pacto, sendo oponível à terceiro apenas quando registrado perante a sociedade em livros próprios.

Mesmo quando não depositado perante a sociedade, o existência do acordo de acionista impede que a sociedade tome atitudes contrárias ao estabelecido no acordo de acionistas.

A sociedade, por exemplo, não pode registrar um voto contrário ao estabelecido em acordo de acionista. Não pode, todavia, fazer prevalecer o previsto no acordo de acionista, devendo a parte que se sentir lesada buscar execução judicial do acordo para que ele prevaleça perante a sociedade.

Como visto acima, acordo de acionista tem como objeto a regulamentação do exercício dos direitos de acionista, ou seja, o acordo de acionista sempre irá regulamentar a forma que os contratantes irão exercer o seu direito de acionistas, bem como o direito de alienação de sua participação na sociedade.

Devido ao seu objeto, as partes do acordo são sempre os acionistas, pessoas físicas ou jurídicas. Não se admite que terceiros estranhos à companhia façam parte do acordo de acionistas.

A própria companhia, inclusive, não pode ser parte do referido acordo.

Denise Chachamovitz Leão de Salles[xxii] afirma que companhia, todavia, pode anuir ao acordo de acionista, como forma de ratificar o acordo. Confira-se:

     “Poderá a sociedade, no entanto, anuir expressamente com seus termos, prática essa comumente adotada nos acordos celebrados sob a vig6encia da Lei Societária brasileira. Isso porque a anuência expressa é prova irrevogável de conhecimento e da subsunção aos seus termos, que veio se somar à presunção de publicidade obtida pelo arquivamento do acordo na sede social e averbação nos livros societários.”

Dessa forma, a companhia pode ser anuente do acordo de acionista, não podendo, todavia, figurar como parte.
3.1 – DA NATUREZA JURÍDICA DO ACORDO DE ACIONISTA E DA SUA OBRIGATORIEDADE

A doutrina diverge quanto à natureza do acordo de acionista.

Luiz Rodolfo Cruz[xxiii] afirma que acordo de acionista tem natureza contratual. Confira-se:

    “Ainda que não totalmente pacífico na doutrina, assumimos a independência dos pactos parassociais do tema e da disciplina jurídica das sociedades, considerando que, mesmo existindo afinidades e inter-relacionamento de matérias, o pacto será sempre acessório, autônomo, e não societário. O pacto ou acordo parassocial é um contrato formal, que deve respeitar os princípios de normas pertinentes à disciplina jurídica dos contratos.”

Na mesma linha, Evelym Balassino[xxiv] afirma que o acordo de acionistas é um pacto de direito civil, regido pelas normas da teoria geral do direito das obrigações contratuais. Confira-se:

    “este é um pacto regido pelas normas da teoria geral do direito das obrigações contratuais, uma vez que seu objeto tem em vista o exercício dos direitos oriundos da qualidade de acionista, situação jurídica que diz respeito à esfera particular da pessoa dos contratantes, criando direitos e obrigações que serão inseridas no patrimônio dos mesmos, e não da sociedade. Enfim, os acordos de acionistas disciplinam direitos e interesses dos sócios, sendo, por conseqüência, regido pela teoria geral das obrigações contratuais.”

Já o ilustre professor Modesto Carvalhosa[xxv], classifica o acordo de acionistas como um pacto acessório ao estatuto social e dele sempre dependente. Confira-se a visão do autor, quando trata exclusivamente do acordo de voto e controle:

    “Nos acordos de voto e controle, negócios tipicamente parassociais, essa conexão existe no plano da gênese e da permanência do pacto, à medida que os acordos de voto e de controle têm sua sorte ligada não apenas à existência da pessoa jurídica e à validade e eficácia de determinadas cláusulas de seu estatuto, mas também à perfeita consonância ente os interesses pessoais dos sócios e aqueles da companhia, não só quanto às cláusulas, como à própria conduta harmônica e leal dos seus signatários no curdo da vigência do mesmo (§2).”

Considerando o acordo de acionista de natureza civil, a ilustre doutrinadora Evelym Balassino[xxvi] afirma que existe a possibilidade de resilição unilateral do contrato. Confira-se:

    “A tal princípio, entretanto, em face da efemeridade das obrigações, não é dado vincular perpetuamente os contratantes, sendo inalienável a liberdade individual. Por esse motivo, o ordenamento jurídico autoriza a resilição unilateral dos contratos que tenham por natureza a restrição prolongada da liberdade dos contratantes, dentre os quais se encontram os contratos de execução continuada. Caracterizando, o acordo de acionistas, como contrato de execução continuada, sendo da sua natureza a restrição severa e prolongada de determinados aspectos da liberdade dos contratantes, relacionados ao exercício de certos direitos que lhe garantem a condição de acionista, é permitida às partes desse contrato a denúncia imotivada, no caso de acordo de acionistas celebrados a prazo indeterminado.”

Contrário a esse entendimento, Modesto Carvalhosa[xxvii] afirma que o acordo de acionista, por ele chamado de contrato parassocial, é um contrato plurilateral e que, por isso, a resilição unilateral só poderá ocorrer justificadamente. Confira-se:

    “Em face da natureza de contrato parassocial, e plurilateral dos acordos de voto, neles não prevalece o princípio da rescindibilidade, mas sim o da dissolução, como aventado. Assim, se decorrido o termo ou o prazo consignado (§6), o acordo de voto extingue-se ‘ipso facto’. Se, porém, a avença for por prazo indeterminado, a sua dissolução será sempre motivada, ou seja, pela quebra da ‘affectio’ ou deslealdade, como acima referido. Aplica-se, à hipótese, o procedimento dissolutório da própria companhia, como contrato plurilateral, que é (art. 206).

Dessa forma, vemos que a doutrina diverge quando à classificação do acordo de acionista e quanto a possibilidade de resilição unilateral.

Alheio à divergência Doutrinária, temos como certa a natureza contratual do acordo de acionista e sua total capacidade de regular aos interesses dos acionistas. Assim, o acordo de acionista se submete ao princípio pacta sunt servanda, que norteia nosso direito contratual, de forma que as partes ficam obrigadas a cumprir integralmente suas previsões.
3.2 – MATÉRIAS QUE PODEM SER REGULADAS

Como anteriormente visto, a Lei n° 6.404/76, em seu artigo 118, estipula algumas matérias que podem ser tratadas no acordo de acionistas.

O referido dispositivo, em verdade, indica algumas matérias que deverão ser respeitadas pela companhia no caso de arquivamento (compra e venda de ações, preferência para adquiri-las e ou exercício do direito de voto). Assim, o dispositivo legal não traz qualquer limitação ao acordo de acionistas.

Ensina o ilustre professor Fábio Ulhoa Coelho[xxviii]:

    “Assim, sobre o exercício de voto de vontade e demais aspectos das relações societárias, os acionistas podem livremente entabular as tratativas que reputarem oportunas à adequada composição dos seus interesses.”

Portanto, existe ampla liberdade para contratação através do acordo de acionistas, liberdade essa que decorre do fato do acordo de acionista sempre regulamentar direito patrimonial e disponível.

Em se tratando das restrições à negociação de ações, o assunto mais delicado que o acordo de acionista pode regulamentar, devido ao mandamento constitucional que garante que ninguém será obrigado a manter-se vinculado a qualquer sociedade, José Waldercy Lucena[xxix] ensina que nas companhias fechadas é possível criar, através do acordo de acionistas, restrições a circulação de ações, impedindo a entrada de terceiros no empresa. Confira-se:

    “É assim realmente há de ser, haja vista que, prevalecendo na companhia fechada a sua natureza contratual, a ‘affectio societatis’ e o ‘intuitus personae’, nada mais coerente do que permitir aos acionistas, geralmente familiares ou de estreita ligação, a introdução, no próprio estatuto, de regra que, restringindo a circulabilidade das ações, evitem que elas sejam transferidas a estranhos, ou seja, terceiros sem vínculo com o restrito grupo originário que constituiu a sociedade. E a par dessas restrições estatutárias, podem ainda os acionistas outras criar, mediante acordo de acionistas, no qual disciplinarão tudo aquilo que for de seu interesse.”

Portanto, na visão do Doutrinador, é permitida criação, em acordo de acionista, de regra que limite a circulação de ações.

O ilustre professor José Waldercy Lucena[xxx] entende que o acordo de acionistas também pode impor limitação à circulação de ações na companhia aberta, apesar da lei impedir expressamente que seja incluída cláusula nesse sentido no estatuto social. Confira-se:

    “A companhia aberta, ao contrário, em que prevalecem sua natureza institucional e a proteção dos investidores, comporta tão-somente a formalização de acordo de acionistas, já que não lhe é permitida a criação estatutária de limitação à circulação de ações.”

Vemos, portanto, que não existe limitação legal específica para o acordo de acionistas.

No entanto, existem algumas normas gerais que estabelecem algumas limitações para o acordo de acionistas. Essas limitações serão tratadas no próximo item deste trabalho.
3.3 – MATÉRIAS QUE NÃO PODEM SER REGULADAS

Apesar de ampla liberdade de contratação, a doutrina aponta algumas matérias que o acordo de acionistas não pode regular.

Denise Chachamovitz Leão de Salles[xxxi], em sua obra, traz a visão de Celso de Albuquerque Barreto com relação aos assuntos que não podem ser tratados no acordo de acionista.

Na visão do Autor, não se pode incluir no acordo de acionistas:

a) objeto indeterminado o impreciso, que o torne inespecífico ou inaplicável;

b) cessão definitiva de direito de voto sem a transferência de ações;

c) negociação do direito de voto em troca de vantagens (art. 177, §2, do Código Penal);

d) violação aos direitos essenciais dos acionistas ( art. 109, da Lei 6.404/76);

e) violação da legislação antitruste e de proteção à economia popular;

f) exercício abusivo do poder de controle;

g) prejuízo ao interesse social;

h) declaração de verdade.

Extrai-se dos itens cima que, em regra, o acordo de acionista não pode contrariar a natureza das ações, os direitos básicos dos acionistas e os interesses da companhia.

Dessa forma, vemos que o pacto não pode ser fixado com objetivo de trazer prejuízos excessivos a qualquer das partes ou da sociedade.

Além disso, sendo admitida a natureza acessória do acordo de acionista, este não pode estabelecer regras que contrariem o estatuto social.

Fábio Ulhoa Coelho[xxxii] traz alguns outros exemplos de matérias que não podem ser incluídas no acordo de acionista, dentre elas a proibição de realização das “declarações de verdade”. Confira-se:

    “É nula a cláusula de acordo de acionista que estabeleça, por exemplo, a obrigação de votar sempre pela aprovação das contas da administração, das demonstrações financeiras, ou do laudo de avaliação de bens ofertados à integralização do capital social. Também é nula a estipulação de um acionista votar segundo a determinação de outro.”

O ilustre professor Modesto Carvalhosa[xxxiii] ensina que o acordo de acionista não pode realizar “comércio de voto”. Confira-se o entendimento do insigne jurista:

    “A primeira modalidade de ilicitude será a do comércio de voto. Este pode manifestar-se de diversas formas. Uma delas é a de delegar a outros convenentes o voto nas assembléias gerais, sem que, no próprio contrato, tenham sido especificadas as matérias e as diretrizes respectivas. A outra forma ilícita seria a convenção através da qual se obrigaria a acionista ou o controlador a votar conforme vontade dos administradores da companhia ou do grupo de controle ou, então, de pessoas estanhas a ela (arts. 115 e 117), ou, ainda de acordo como os interesses de sociedade controladora fora dos termos da convenção do grupo (art. 270).”

O professor também ensina que o acordo não pode ter por objeto declaração de verdade, que seria, por exemplo, uma declaração sobre a aprovação de contas. Confira-se[xxxiv]:

    “Jamais o acordo de voto e de controle poderá ter por objeto ato de verdade, como, v. g., aprovação de relatório e contas da administração ou balanço e demonstrações de contas ou mesmo a ratificação de atos de natureza legal, dividendos obrigatórios declarado pelos órgãos da administração (art. 202) etc. Nesse caso, haveria típica ilicitude, representada pela convenção de voto e de controle a favor dos atos de administração e fiscalização da companhia. Será, em conseqüência, nulo o voto dado sobre essas matérias, desde que se originem de acordo de acionistas. A nulidade, na espécie, é formal, independentemente, portanto, de prova de conluio ou favorecimento.”

É importante consignar que não são admitidos acordos entre os acionistas e a companhia, conforme visto nos itens anteriores deste trabalho. Também não são admitidos acordos entre acionista e administradores que não são acionistas[xxxv].

Em resumo, temos que, não obstante a liberdade de contratação sobre direitos patrimoniais e disponíveis, o acordo de acionista não pode tratar de matéria que contrarie a natureza das ações, os direitos básicos dos acionistas e os interesses da companhia.
3.4 – DO ARQUIVAMENTO DO ACORDO DE ACIONISTAS

O acordo de acionista, por ser um documento em regra particular, é oponível contra terceiros e contra a companhia apenas quando registrado em livros próprios.

Esse registro tem o objetivo de proteger os futuros adquirentes de ações.

O arquivamento é exigido pelo art. 118, da Lei 6.404/76. Confira-se o que diz a lei:

    “Art. 118. Os acordos de acionistas, sobre a compra e venda de suas ações, preferência para adquiri-las, ou exercício do direito de voto, deverão ser observados pela companhia quando arquivados na sua sede.

    § 1º As obrigações ou ônus decorrentes desses acordos somente serão oponíveis a terceiros, depois de averbados nos livros de registro e nos certificados das ações, se emitidos.

    (…)

    § 4º As ações averbadas nos termos deste artigo não poderão ser negociadas em bolsa ou no mercado de balcão.

Como a Lei indica alguns assuntos, surge a seguinte dúvida: se o acordo de acionista regular matéria não elencada no caput do artigo 118, a companhia deverá respeitar? A resposta para é “sim”, pois a companhia deve respeitar não apenas os acordos tratando das matérias citadas no caput do art. 118. Todo acordo arquivado, não importa a matéria, se válido, deve ser respeitado pela companhia, sendo possível, inclusive, a execução judicial do que foi acordado. Veja o que ensina André Luiz Santa Cruz Ramos[xxxvi]:

    “(…) se o acordo for arquivado na sede da sociedade anônima, ela deverá respeitá-lo, podendo o interessado, inclusive, requerer a execução judicial do que foi acordado, conforme disposto na própria lei (…)”.

Dessa forma, vê-se que o acordo de acionista, por expressar a livre manifestação de vontade do acionista, deve ser respeitado pela companhia quando arquivado em livro próprio.

Além disso, com o arquivamento em livro próprio, o acordo de acionista passa a ter validade contra terceiros, nos termo do parágrafo primeiro, do art.118, da Lei. 6.404/76.

Leia mais: http://jus.com.br/artigos/25104/acordo-de-acionistas-caracteristicas-e-limites#ixzz3Gzg3DInn

SOUZA, Cleiton Soares de. Acordo de acionistas: características e limites. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3707, 25 ago. 2013. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25104>. Acesso em: 20 out. 2014.

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