Nesta oportunidade, em que várias mudanças de regras e flexibilizações vem acontecendo em relação à situação de pandemia causada pelo Coronavírus, não podemos deixar de apresentar algumas considerações sobre os seguros, aqueles que garantem indenizações em caso de morte, incapacidade temporária por doença ou por período de internação.

Para que esta compreensão seja possível, se faz necessário destacar o conceito de seguro, sim, aquele estampado pelo ordenamento, determinado por Lei, sendo que: “Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados”.

Destacamos, então, algumas palavras deste conceito para destacar que, através de um contrato de seguro, a seguradora só será obrigada a lhe pagar (ou aos beneficiários) uma indenização securitária, no caso de ser mantido os pagamentos dos prêmios que foram estipulados, através de um interesse legítimo (leia-se, não ter sido dado causa de forma livre e consciente pelo próprio segurado) contra riscos especificamente previstos no momento da contratação.

O que isso quer dizer?

Quer dizer que, no caso de ocorrência de um fato que cause dano não estar devidamente previsto e contratado, não há obrigação da seguradora de lhe pagar qualquer indenização sobre ele. Esta situação fica ainda mais evidente nos termos de riscos excluídos da cobertura que, igualmente, retiram esta obrigação de indenizar da seguradora e de ser indenizado o segurado, mesmo que ocorra o risco previamente pactuado, mas, que incidindo estas exclusões, não será indenizado.

Embora poucas pessoas tenham o cuidado de ler os termos contratuais, há exclusão explícita nos contratos de retirar da seguradora a obrigação de pagar qualquer indenização que seja decorrente de PANDEMIA.

Argumenta-se, nesse sentido, que, se assim não fosse, a estabilidade financeira e a capacidade de pagamento de reivindicações das seguradoras ficariam fortemente comprometidas, tendo em vista a grande concentração, no tempo e espaço, de sinistros com mensuração atuarial praticamente inalcançável.

Sabe-se então que, em condições normais de temperatura e pressão, o segurador possui respaldo da Órgão Governamental Controlador de Seguros (SUSEP) para que a delimitação do seu risco contratual não agasalhe eventos associados a epidemias e pandemias. Seria tal respaldo, no entanto, suficiente? Dito de outra forma: o segurador poderá escudar-se do pagamento de indenizações associadas à pandemia da Covid-19 com base em cláusula de exclusão de riscos imposta ao segurado em contrato por adesão?

Pois bem, nas relações de consumo, o cumprimento do dever de informação pelo segurador e a abusividade da cláusula de exclusão de responsabilidade disposta em um contrato por adesão estão entre as questões a gerar discussões. Por exemplo, o falecimento, na sequência de uma infecção pela Covid-19, provavelmente acabará sendo coberto pelos seguradores, a despeito de eventual cláusula que estipule o contrário.

Tal relativização da exclusão de cobertura não poderá ser considerada uma confissão de culpa do segurador, gerando-se uma aplicação automática do mesmo raciocínio a outras modalidades.

Já com relação a cobertura de interrupção de negócios, nos seguros de riscos operacionais demonstra-se um terreno fértil para discussões jurídicas atinentes à Covid-19. Em que pese a cobertura do segurador geralmente se restringir a avarias, perdas e danos materiais, decorrentes de acidente de origem súbita e imprevista, causada diretamente a bens segurados, a falta de clareza de algumas apólices tende a gerar disputas nada desprezíveis.

Outro campo que envolve quantias volumosas no setor de seguros internacional é o do seguro para eventos – que, em alguns casos, garante expressamente riscos associados a pandemias.

Tudo isso a demonstrar que as mais variadas modalidades de seguro serão impactadas e que as seguradoras terão de fazer um gerenciamento de riscos, financeiro e de sua reputação, de forma muito cuidadosa para que, as atitudes de agora, não criem uma situação de completa falência sem chances de recuperação, pois não haverá segurados contratando e mantendo novos contratos.

Assim como a maioria das áreas da economia, o setor segurador não está imune à crise sistêmica. Se é bem provável que, daqui para a frente, boa parte de toda essa problemática se resolverá via aumento geral de prêmios para a inclusão da cobertura de riscos ligados a pandemias ou com a implementação de um pool de resseguro obrigatório de risco pandêmico, no atual momento a situação afigura-se bastante incerta.

A sociedade encontra-se diante de desafios sem precedentes, e não há como se projetar o efetivo impacto do novo coronavírus nas relações securitárias. O dificultoso equilíbrio entre a proteção do segurado e da seguradora dependerá de uma atuação certeira pela SUSEP e o Judiciário, para além dos próprios segurados e seguradores, que deverão negociar de boa-fé cada regulação de sinistro.

O que vale, portanto, é buscar, no mínimo, a flexibilização das regras pactuadas, como vem sendo recorrente na maioria dos contratos pois, embora a seguradora não seja obrigada à indenizar um evento pelo qual não assumiu e não entrou no cômputo do valor do prêmio a receber, o segurado nunca firma um seguro para usar mas, sim, para que, vindo a ser necessário, possa garantir um mínimo de tranquilidade para seus beneficiários, para sua empresa, para sua renda entre outros, evitando a falência ou evitando a descontinuidade do projeto de vida.

Vale ressaltar que, conforme pesquisa, algumas seguradoras já emitiram notas de conhecimento de alteração de política interna, garantindo toda e qualquer indenização, integral, para os sinistros decorrentes do Coronavírus para os casos da Europa, Ásia e América do Norte.

Deve-se, sim, buscar a flexibilização, a boa conversa, pautada na boa-fé que deve ser o norte principal das relações contratuais para que, então, não vindo a ser obtida, as demandas sejam levadas ao Judiciário e aos Órgão reguladores para que, então, estes decidam da melhor forma que se possa decidir.